Professor da UFBA critica inércia da maioria das entidades do movimento negro baiano diante das mortes de pessoas negras pela Polícia Militar
A atuação da Polícia Militar da Bahia tem sido alvo de severas críticas por parte da comunidade academica, especialmente após a ocorrência de mais uma tragédia envolvendo a morte de pessoas negras. No entanto, segundo o professor Samuel Vida, docente da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, a indignação aumenta ao observar a inércia cúmplice da maioria das entidades do movimento negro baiano, que parecem cooptadas e amansadas pelo governo petista.
“Enquanto a população demanda ações concretas para pôr fim ao genocídio negro e uma reformulação das práticas policiais, muitas entidades do movimento negro parecem não responder de forma efetiva a essas questões urgentes, o que gera um sentimento de desamparo e revolta na comunidade afetada.”, provocou o docente na tarde dessa segunda-feira (31).
Os acontecimentos recentes, como a morte de quatro jovens em uma operação em Cosme de Farias, levantam questões cruciais sobre o uso da força policial e a proteção dos direitos humanos, especialmente das pessoas negras que historicamente têm sido alvo de abusos e discriminação.
É fundamental que o movimento negro, enquanto representante legítimo da luta contra o racismo e a violência policial, enfrente de maneira enérgica e independente as injustiças e violações dos direitos humanos. A falta de posicionamento claro e incisivo pode minar a confiança da sociedade nas entidades do movimento negro e prejudicar a busca por uma sociedade mais justa e igualitária.
Diante deste cenário, é imperativo que as entidades do movimento negro da Bahia se unam em prol de uma resposta efetiva e assertiva, cobrando investigações rigorosas, transparência nas operações policiais e medidas concretas para combater a discriminação racial e a violência desmedida.
O enfrentamento dos problemas estruturais requer uma ação coletiva e comprometida de todos os setores da sociedade, incluindo as entidades do movimento negro, para que se alcance uma mudança significativa e duradoura. Somente assim será possível avançar em direção a uma realidade em que todas as vidas sejam respeitadas e protegidas, independente de sua origem étnica ou social.
Salvador e RMS têm 4,5 tiroteios por dia
Coluna do jornalista Bruno Wendel, publicada no Correio da Bahia denuncia mais de 4 tiros por dia em Salvador e Região Metropolitana a partir de dados do Instituto Fogo Cruzado. Leia trecho do artigo.
Tiros dos mais diversos calibres, inclusive de fuzil, cortam o céu constantemente, e moradores vivem dias de terror com a escalada da violência em Salvador e região metropolitana. Isso porque de janeiro até o dia 28 deste mês, foram registrados 939 tiroteios, segundo o Instituto Fogo Cruzado. Uma média de 4,5 confrontos por dia entre traficantes e também em ações policiais. Desse total, 711 pessoas morreram.
Ainda de acordo com os dados, 900 pessoas foram baleadas e apenas 189 sobreviveram. Dos 939 confrontos, 341 ocorreram em ações policiais. Já no primeiro semestre deste ano (até junho), o Fogo Cruzado registrou 792 tiroteios com 759 vítimas. Em média, foram 132 tiroteios por mês e aproximadamente quatro por dia entre janeiro e junho de 2023.
“São bairros violentados, e a gente precisa ver que existe uma mobilização de organizações ligadas ao tráfico de drogas e de armas do Sudeste para o Nordeste, a Bahia, em particular, e uma pulverização desse comércio, o que tem ampliado o número de conflitos. Em paralelo, o Estado continua optando pela mesma lógica de incentivo ao confronto, ter uma polícia muito letal e que participa de cerca de 35% dos tiroteios que a gente monitora, além da ocupação de territórios negros e periféricos”, declara o sociólogo Dudu Ribeiro, da Iniciativa Negra, organização da sociedade civil parceira do Fogo Cruzado na Bahia.
O instituto usa tecnologia para produzir e divulgar dados abertos e colaborativos sobre violência armada, fortalecendo a democracia. Com uma metodologia própria, o laboratório de dados da instituição produz 40 indicadores inéditos sobre violência nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Recife, Salvador e, futuramente, Belém.
Segundo Ribeiro, para se ter um ambiente seguro, é preciso prevenir a violência. Neste caso, o Estado deve investir na formação dos agentes de segurança pública e, principalmente, nas comunidades e nas pessoas que sofrem essa violência. “ O primeiro ponto é acreditar que se faz segurança pública com ciência. A gente precisa produzir melhores dados. A Bahia está entre os piores do Brasil na produção e transparência de dados. Se se faz boas políticas públicas se a gente sabe onde está incidindo. É preciso entender que as políticas de segurança não precisam ser feitas somente pelas polícias. O Estado precisa entender que as secretárias ligadas à educação, cultura, trabalho e justiça têm um papel a cumprir na segurança pública”, declarou Ribeiro.
Para o coordenador do Ideas (Assessoria Popular), Wagner Moreira, a violência “tem se dinamizado nos últimos anos e compreendê-la é importante para construir novas estratégias na política de segurança mais inteligentes e menos engessadas”. “Não é a primeira vez que ocorre alta da violência letal associada à disputa de facções nacionais em territórios soteropolitanos. A guerra entre facções ‘atrai’ resposta institucional. E passamos a ver no mesmo território a guerra entre o ‘mundo do tráfico’ e em paralelo a guerra entre a polícia e o tráfico. Estas guerras respondem a parte significativa da violência territorial. É imprescindível discutir o fracasso do modelo de ‘guerra às drogas’ e seu impacto nos territórios negros”, pontou.